terça-feira, 13 de abril de 2010

Sempre não! Só toda vez!

Querer que juiz acerte sempre é irracional

Por Marina Ito

O processo não pode dispensar a obtenção de resultados justos, mas isso não significa, necessariamente, que outros valores deverão ser deixados de lado. O processo justo deve incorporar duas ordens de valores: o valor da Justiça em função da qualidade da decisão e ao mesmo tempo outros dentro da estruturação do processo a fim de conseguir um equilíbrio. A constatação é do ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal, que falou sobre segurança jurídica, na sexta-feira (9/4), na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro.

Para um auditório lotado, Peluso afirmou que o processo é basicamente uma obra lingüística. “Se não atentarmos para isso, vamos pensar que o processo discute fatos quando discute enunciados lingüísticos”, disse.

O ministro observou que um historiador pode levar 20, 30 ou 40 anos para chegar à sua verdade e cientistas podem estabelecer verdades provisórias, mas o Judiciário precisa de um limite. “A verdade processual é sempre aproximativa, nunca uma verdade absoluta, mas basta como critério para valorar a racionalidade dos métodos processuais”, disse.

Ele afirmou, ainda, que isso faz parte do limite humano. “A Justiça processual é imperfeita”, disse. Por isso, deve reconhecer outros aspectos fundamentais do ordenamento, como a estruturação do processo, “tudo o que é cultuado dentro do processo por princípios processuais”. Não dá para ir além. “Querer que o homem voe, é uma postura irracional. Querer que o juiz acerte sempre em relação à verdade real é outra postura irracional. Quando for possível ao homem voar, provavelmente os juízes acertarão em todas as decisões”, afirmou o ministro.

Peluso também falou sobre a coisa julgada, fenômeno processual que pode se prolongar depois do trânsito em julgado. “Prolonga-se como algo irracional, não tem sentido em termos jurídicos.” A coisa julgada nesse sentido, disse, revela a incapacidade intrínseca do processo de conseguir com certeza absoluta o resultado justo. “É necessário até para decisões injustas porque a ninguém interessa um resultado justo em um tempo absolutamente longo. Há um momento em que vida humana tem que ter certeza.”

“O Direito tem limite e este é o limite da condição humana”, completou o ministro. Para Peluso, isso está ligado ao conteúdo possível da garantia constitucional, chamado de devido processo legal e o princípio legal de um processo justo.

Na palestra, o ministro tratou da ênfase no devido processo legal na Constituição Italiana e nas discussões que o “devido” suscitou. Uns, explicou, diziam que as garantias processuais não eram apenas fim, mas também meio. Outros, que a cláusula constitucional apontava para uma Justiça superior às garantias processuais. Peluso falou também sobre as diferenças entre a Justiça do processo e a Justiça do resultado do processo. Explicou, ainda, a importância da justificação na sentença e da dificuldade de se encontrar a verdade do processo.
O diretor da Emerj, desembargador Manuel Alberto, disse que a escola vai disponibilizar em seu site a gravação do evento, que contou com a presença do presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, e com o ministro aposentado Sepúlveda Pertence. O seminário, promovido pelo Instituto Victor Nunes Leal, reuniu na plateia vários desembargadores do TJ fluminense, além de advogados e estudantes.

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